sábado, 10 de janeiro de 2009

Além da Linha Verde

Olá amigos!

Como devem saber, Curitiba está passando por um processo de reorganização urbanística,
centrado na construção da Linha Verde, já há muito anunciada.
Acerca deste tema, compartilho com vocês a seguinte análise
sobre este projeto da Prefeitura de Curitiba.

Abraço a todos!

Além da Linha Verde
Publicado em 08/01/2009 Bruno Meirinho

Durante a campanha eleitoral de 2008, tive a oportunidade de debater na televisão com o candidato Beto Richa sobre as isenções da Linha Verde, noticiadas na imprensa ("Linha Verde divide a cidade e opiniões", Gazeta do Povo, 25/5/2008). Ele respondeu afirmando que não há benefícios fiscais na Linha Verde, que eu não devia insistir nessa "tese". Contraditoriamente, reconheceu que há isenções para empresários do Tecnoparque. E onde fica o Tecnoparque? Consultando o site da prefeitura em 7 de outubro de 2008, encontrei o artigo "Linha Verde movimenta mercado imobiliário", muito explicativo sobre o projeto, focado em favorecer a manipulação imobiliária. O texto exalta a vocação da Linha Verde em multiplicar os valores dos imóveis próximos, especialmente perto do que se chamou de "estrela" do projeto, o Polo Tecnoparque, no entorno do cruzamento da Marechal Floriano com a Linha Verde.
Na propaganda oficial, o Tecnoparque faz parte da Linha Verde. É justamente o local mais agitado do mercado imobiliário. Mas quando se mostra que é também onde estão as mais irresponsáveis isenções de impostos, a prefeitura nega que faça parte do projeto. Está lançada a confusão.
Para trocar mais impressões sobre o assunto, em julho de 2008 estive em Assunção, no Paraguai, em um encontro de especialistas latino-americanos em grandes projetos urbanos, organizado por um instituto internacional de políticas urbanas (Lincoln Institute). Lá, apresentei um estudo meu sobre a Linha Verde, apontando o projeto como mais um capítulo do urbanismo e do planejamento excludentes que se perpetuaram em Curitiba. No encontro, um consenso: é preciso aperfeiçoar mecanismos para recuperar os investimentos públicos, sem benefícios injustos para especuladores imobiliários.
E o que é a Linha Verde? O mais atual exemplo do planejamento excludente de Curitiba é um projeto faraônico de propaganda, que se arrasta desde a gestão de Cassio Taniguchi e que consegue concentrar o que há 40 anos tem sido feito para tornar Curitiba uma cidade-modelo em exclusão, num impressionante citymarketing.
Responsável por um endividamento de centenas de milhões de reais, a Linha Verde drena os recursos da cidade, dos impostos dos trabalhadores, e os concentra em um local destinado à valorização do mercado imobiliário e ao favorecimento de empresas globais. Esse processo é o que chamamos de concentração da riqueza.
Como noticiado pela própria prefeitura, as obras multiplicam os valores dos imóveis dos proprietários beneficiados, na faixa do entorno da Linha Verde e nos polos – e isso se dá com dinheiro público. Ao final, favorece poucos, principalmente pela injustiça tributária do Brasil em que os pobres pagam muito mais impostos que os ricos, como recentemente divulgado pelo Ipea, que declarou que os mais pobres pagam 40% mais impostos que os mais ricos.
Os ricos também devem pagar impostos e existem instrumentos que permitem à prefeitura reverter essa injustiça, rompendo a lógica de endividar a cidade para os trabalhadores pagarem a conta. Os mecanismos mais conhecidos são o IPTU progressivo e a contribuição de melhoria. No entanto, a cobrança por melhorias só é regra contra os pobres, pois em qualquer bairro de baixa renda de Curitiba, quando a prefeitura vai implantar a infraestrutura básica essencial, cobra dos moradores a fatura. A história é sempre a mesma: primeiro vem a manilha e o asfalto, depois a taxa da prefeitura. Conformados, os trabalhadores aceitam; afinal, nada vem de graça.
Mas na Linha Verde não está prevista nenhuma taxa de infraestrutura ou contribuição de melhoria. É tudo "de graça". Para quem? Todo o investimento resultará em dívida para a cidade – leia-se, o trabalhador – pagar. Ao fim, os moradores dos bairros mais pobres, pagam, como sempre, duas vezes: primeiro pela própria infraestrutura, depois pela infraestrutura das grandes empresas globais, favorecidas por obras como a Linha Verde.
A falta de contribuição de melhoria nesta obra, por si só, é uma isenção. Além disso, outros benefícios fiscais foram planejados para o setor especial da BR-116 – e inexplicavelmente falta a recuperação dos investimentos. É na base do empréstimo de bancos internacionais.
No Tecnoparque, considerado pela prefeitura o mais importante polo da Linha Verde, os benefícios vão além: estão garantidos, por 10 anos, além da ausência de taxas e da contribuição para a melhoria, as isenções totais de IPTU e ITBI.
Enquanto as atenções da prefeitura estão voltadas para o projeto, vemos que a urbanização e a regularização das vilas e favelas, para a segurança física e jurídica das moradias dos trabalhadores, está longe de ser prioridade, mesmo custando menos e sendo mais importante que a drenagem milionária de recursos para um só lugar.
Por isso, os socialistas realmente preferem e lutam por uma repartição melhor dos recursos da cidade, em oposição aos projetos de concentração da riqueza. É nessa posição que me coloco. Mais: é urgente ir além e atacar as causas que produzem as catracas da cidade.
O maior problema está no modo de produção injusto e excludente, que continuará construindo cidades excludentes, das quais Curitiba é um triste "modelo". Nada a comemorar. Não queremos uma cidade-modelo em exclusão. Cada vez mais, a notícia de isenções de impostos na Linha Verde deixa de ser uma "tese" e passa a ser triste verdade contra a qual é nosso dever lutar.

Bruno Meirinho é advogado e militante do PSOL. Foi candidato à prefeitura de Curitiba pela Frente de Esquerda (PSOL, PCB, PSTU) e trabalha na Ambiens Cooperativa onde é consultor em projetos de planejamento urbano.

segunda-feira, 22 de dezembro de 2008

No despejo da Fazendinha,
a verdadeira cara
da “cidade-modelo”

Em 23 e 24 de outubro de 2008, Curitiba foi manchete na imprensa nacional. Passou no Jornal Hoje, no Jornal Nacional, esteve entre as “imagens do dia” nos principais portais de internet, mereceu foto na primeira página da Folha de S. Paulo.
O motivo, porém, desse destaque não foi a nova versão da propaganda sobre a cidade-modelo, mas a dura realidade da falta de moradia e da luta de classes.
Numa ação a que não faltaram balas de borracha e bombas de efeito moral, cerca de 1000 policiais, inclusive da Tropa de Choque e da cavalaria, violentamente despejaram milhares de pessoas que ocupavam uma área de 170 mil m2 na rua João Dembinski, a chamada “Ocupação da Fazenda”. Uma ampla operação, enfim, paga com dinheiro público, para, ao mesmo tempo, criminalizar os pobres e deixar ainda mais rico um dos mais poderosos grupos econômicos paranaenses e brasileiros.

Cidade-modelo?

Nas eleições municipais, o PSOL de Curitiba e a candidatura de Bruno Meirinho tomaram como eixo essencial a denúncia do mito da cidade-modelo e a caracterização de Curitiba como um modelo de exclusão e segregação sócio-espacial. Contra isso, propusemos a socialização da riqueza da cidade (a quarta mais rica do Brasil). Nesse contexto, o tema da moradia foi um dos eixos de nosso programa de governo. Em especial, denunciamos que o déficit habitacional no municipal, calculado pela Fundação João Pinheiro em nada menos do que 40 mil famílias (cerca de 200 mil pessoas), convive com a existência de cerca de 60 mil imóveis vazios.
O tom dominante da propaganda eleitoral, contudo, foi substancialmente diferente. Em essência, o prefeito Beto Richa afirmou aos curitibanos que a cidade não apresentava nenhum problema grave e que ele era o melhor prefeito do Brasil. A “oposição”, por sua vez, concordou que a cidade tinha coisas “boas”, afirmando apenas que elas poderiam ficar ainda “melhores”.
Assim, nesse clima de pensamento único, a imensa propaganda e o amplo pacto político da elite curitibana levaram, o prefeito Beto Richa a reeleger-se com quase quatro de cada cinco votos válidos.
Mas as eleições passam, e a realidade permanece. Pouco mais de duas semanas após o primeiro turno das eleições municipais, o conflito na Fazendinha explicita a gritante contradição entre discurso e realidade em nosso município.
Inicialmente, a decisão da Justiça – com a marca de classe que lhe é tantas vezes característica – fez prevalecer o “direito de propriedade” (sempre exigível) a um dos mais elementares (e nunca exigíveis) direitos humanos, o direito à moradia digna.
Em seguida, o poder público formalmente “lavou as mãos”, esvaziando e mesmo ignorando a dimensão política das questões sociais. A prefeitura e, notadamente, o prefeito Beto Richa – tão loquaz durante o período eleitoral – abrigaram-se num silêncio quase absoluto, como se o despejo estivesse por acontecer nos cassinos de Las Vegas. O governo do Estado e a secretaria de Segurança “deram de ombros”, como a afirmar que nada mais lhes restava a fazer que cumprir a ordem judicial. Ao fim, restou à população e às organizações sociais – além dos cassetetes, balas e escudos da Tropa de Choque – a oportunidade de verificar, pela prática, com quem pode e com quem não pode contar nos momentos de luta, presentes e vindouros.

Solidariedade e Repúdio

Diante desse quadro, o PSOL de Curitiba, por meio de seu Diretório Municipal, vem a público manifestar nossa solidariedade com ao povo da Ocupação da Fazendinha e sua luta pela moradia digna. Do mesmo modo, manifestamos nosso mais veemente repúdio à ação de despejo, fundamentada no princípio da criminalização dos pobres, da pobreza e dos movimentos sociais, do que deu mostras tanto a decisão judicial em favor da “reintegração de posse”, quanto a brutal e injustificada violência da ação policial que a cumpriu.
Igualmente, saudamos os militantes e movimentos sociais envolvidos nessa luta, com os quais compartilhamos o ideal de transformação da sociedade capitalista em favor das classes trabalhadoras. A todos aqueles a quem a miséria e a violência de classe causam a mesma indignação que sentimos, lançamos o chamamento para que participem da luta política contra o mito da cidade-modelo em Curitiba e a elite econômica que dele se beneficia.
PSOL/Curitiba Nota Pública
Negrito

Partido Socialismo e Liberdade
Diretório Municipal
Curitiba – PR

quarta-feira, 10 de dezembro de 2008


No início da ocupação, o acampamento de algumas famílias no latifúndio urbano de C. R. Almeida. Mas a demanda por moradia na capital modelo é tão grande que, em poucas semanas...


Aqui já o acampamento provisório (que dura até hoje) no acostamento da rua em frente ao latifúndio. A resistência não é apenas o resultado das pressões da necessidade, é uma atitude política!

sexta-feira, 28 de novembro de 2008

a luta por moradia na cidade-modelo
No dia 23 de Outubro cerca de 1.500 famílias (6.000 pessoas) foram violentamente despejadas de uma área de 170 mil m² que ocupavam no Bairro Fazendinha. A ação foi executada pelo Governo do Estado através da Secretaria de Segurança Pública, e contou com a omissão e o descaso da Prefeitura de Curitiba. A alegação é que se tratava de invasão de propriedade particular, feita por pessoas que não precisavam de moradia. A realidade, contudo, é o contrário disto, - apesar da propaganda oficial afirmar que Curitiba é uma cidade modelo, o fato é que nesta capital existem nada mais, nada menos que 40.000 famílias sem moradia digna, o que corresponde a cerca de 200.000 pessoas.
A área ocupada no Bairro Fazendinha é um imenso latifúndio urbano que não cumpre qualquer função social. O suposto “proprietário” do terreno é um poderoso grupo empresarial, sobre o qual recaem acusações e condenações por grilagem de terra. Por ambos os motivos, a Constituição brasileira respalda que a área deva ser destinada à moradia popular.
As famílias ocupantes da área não são, de modo algum, pessoas “abastadas”, como levianamente alega a Prefeitura, mas trabalhadores organizados que solidariamente lutam pelo elementar direito humano à vida digna. Diante dessa situação, qual é a atitude do poder político e econômico? Envia a polícia para reprimir e criminalizar a luta do povo. Os movimentos sociais, porém, sabem que sua causa é justa e não desistem da mobilização.
No mesmo dia em que estas famílias foram despejadas, cerca de 200 delas voltaram e acamparam nas calçadas, em frente à área ocupada na Fazendinha. A reivindicação é simples: Direito à moradia digna já! Os problemas sociais não podem ser resolvidos pela polícia. Trabalhadores organizados não são criminosos!
Agora, com a palavra, o Poder Público e a Prefeitura de Curitiba...
pela reforma urbana!
pelo direito à cidade!
Está escrito na Constituição que os Governos Federal, Estadual e Municipal devem garantir moradia a todos os cidadãos brasileiros.
Isso quer dizer que temos o direito de morar dignamente, com água, saneamento, eletricidade, trasnporte acessível e de qualidade, escola e posto de saúde. Enfim, temos o direito à cidade.
Mas milhões de brasileiros vivem sem teto ou em condições precárias de habitação. Faltam, no Brasil, 7 milhões de moradias, ao mesmo tempo em que 5 milhões de imóveis permanecem desocupados, por conta de interesses de especulação imobiliária.
Em Curitiba faltam 60 mil moradias, enquanto mais de 56 mil imóveis estão vazios. Essa é a dura realidade da “Capital ecológica”, que a propaganda da Prefeitura e dos grandes grupos imobiliários e construtores tenta esconder.
Esses dados mostram que nossa luta é justa, ao contraio do que dizem os programas sensacionalistas de rádio e TV, comprometidos com o poder político-econômico.
Este terreno de 170 mil m², cercado por barracos de lona é hoje o símbolo maior da desigualdade social e do descaso com a vida por parte das autoridades.
Vigiada por homens armados desde o violento despejo do dia 23 e Outubro, a área reivindicada pelo grupo Varuna/CR Almeida ficará manchada para sempre com o sangue de Celso Eidt, assassinado na noite de 5 de Novembro por pistoleiros encapuzados.
Os movimentos e pastorais sociais, os sindicatos e demais organizações populares reafirmam a solidariedade à luta das famílias acampadas e exigem a desapropriação do terreno para habitação de interesse social.
Não aceitamos que os interesses do grupo Varuna/CR Almeida e as decisões judiciais que colocam a propriedade privada acima da vida prevaleçam diante de tanta injustiça e desigualdade.
Exigimos que as autoridades e Ministério Público investiguem a origem de tal propriedade, que tem sido denunciada pelos movimentos de luta pela moradia como fruto de grilagem.

Coordenação dos Movimentos Sociais – CMS/PR
Assembléia Popular
Comitê pela Cidadania e Contra a Criminalização dos Movimentos Sociais